O início
Eu tinha apenas 15 anos quando cursei o primeiro ano cientifico (hoje intitulado de 1o ano do ensino médio) no colégio particular mais bem conceituado da cidade de Teófilo Otoni, interior de Minas Gerais. Esse foi um ano absolutamente intenso pra mim, uma adolescente tímida, sem muita referência feminina (minha mãe, separada do meu pai, tinha se mudado para os Estados Unidos), morando apenas com meu pai e dois irmãos, um mais velho e um mais novo que eu.
Eu era muito inibida, tinha poucas amigas e hoje eu sei que, na época, eu ainda não havia superado a separação dos meus pais. Mas vocês sabem como é quando se é adolescente. A gente acha que sabe tudo e que é a pessoa mais madura da face da Terra. Quando me perguntavam o que eu achava sobre o assunto, eu somente respondia: “nada a ver, super normal.” E não era normal. (Mas essa história fica pra uma outra oportunidade)
Primeiras mudanças
De uma hora pra outra me vi cercada de novos amigos e amigas, fiz amizade com algumas delas e conheci o meu primeiro amor (que foi absolutamente platônico), mas mexeu com tudo, claro. O que me importava era estar no grupo de estudo dele, ir nas festas que ele ia, e por aí vai. Todo mundo sabe o que é ter um primeiro amor, não é? 🙂
Além de não querer estudar, eu não entendia física e matemática e odiava história e geografia. Na verdade o que eu odiava mesmo eram os professores que as palestravam… O professor é peça fundamental no interesse do aluno em querer entender a matéria e tive péssimos exemplos… Os professores eram prepotentes e não aceitavam ser confrontados, muito menos por mim, uma reles estudante. E tudo foi virando um ciclo vicioso. Quanto mais eu odiava as matérias, menos eu estudava, mais eu “farreava” com a turma e menos nota eu conseguia.
Naquele ano obviamente tomei bomba direto, sem nenhuma possibilidade de fazer recuperação. Era uma causa justa. Comigo, duas amigas também “bombaram”, mas não sei se a bomba foi um presente pra elas como foi pra mim.
“Em uma grande vitória, o que existe de melhor, é que ela tira do vencedor o receio de uma derrota.”
– Friedrich Nietzsche
A “bomba”
Enfim, a bomba veio, e junto a ela, a bronca do meu pai, claro. No ano seguinte a vida não seria tão fácil pra mim. Eu sabia disso e não podia reclamar absolutamente de nada. Meu dever era estudar e passar, afinal de contas, quem iria suceder meu pai na medicina??? Chega então minha segunda tentativa no primeiro ano. Comecei o ano escolar meio sem pretensão, em companhia da minha amiga (que também tinha perdido o ano), o que me confortava um pouco. A diretora da escola, uma pessoa neurótica e alienada, sempre que entrava na sala e nos via juntas, fazia questão de enfatizar que éramos “vagabundas” e não servíamos de modelo pra ninguém (é óbvio que eu falei isso com meu pai e ele foi tomar satisfação com a diretora, pois não era porque eu estava repetindo o ano pela segunda vez que eu não merecesse uma segunda chance).
Alguns professores permaneceram os mesmos, infelizmente, mas outros foram substituídos, para minha alegria e sucesso. As primeiras provas vieram e eu fiquei com as notas na “beirada”. Não perdi média, mas também não me superei como meu pai esperava (e cobrava). Aos poucos os professores de matemática e física realmente se fizeram presentes e cruciais na mudança que eu ia experimentar em breve.
Só abrindo um pequeno parênteses, foi nesse ano que conheci a pessoa que iria se tornar o pai dos meus filhos 🙂 Mas fica pra outro post se ele deixar eu compartilhar a nossa história.
A grande mudança
Bom, tentando resumir um pouco…
Através desses professores eu fui descobrindo a vida além da morte. A matemática, física e química eram passíveis de compreensão. Tudo realmente dependia de como o professor poderia comprová-las. E fui aprendendo do zero (como se eu não tivesse estudado realmente nada no ano anterior), passando a GOSTAR de estudar e melhorando as notas gradativamente. A química foi mais complicada por causa do professor: quase chegando no final do ano ele me falou, na frente de toda a sala, que eu não era capaz de conseguir nota suficiente para passar de ano e a recuperação era certa. Foi a primeira vez que uma luzinha se acendeu dentro de mim. E eu estudei tanto, mas tanto, que consegui muito mais além da nota que precisava para passar e fiz questão de falar com professor quando ele me entregou a última prova. Aliás, passei em todas as matérias com notas excelentes (menos história e geografia que foram os grandes impasses da minha vida acadêmica).
Pontos pessoais
Passei o ano anterior odiando tudo e todos, e por causa de alguns excelentes professores (e minha vontade própria), o gosto pelo estudo apareceu de forma maravilhosa durante essa minha segunda chance. Nunca fui a melhor aluna da sala, nem no colégio nem na faculdade e posso dizer com orgulho que meu pai nunca me cobrou isso. Não perdi minha vida estudando, mas essa repetência de ano foi o primeiro divisor de águas na área acadêmica e pessoal. Aprendi que posso aprender, aprendi que as segundas chances realmente existem e que sempre vai haver alguma barreira que, se não puder ser ultrapassada, pode ao menos ser contornada, como um rio passando ao lado das grandes montanhas.
Ensinamentos e conclusão
Há coisas na vida que nos obrigam a dar um ou dois passos atrás pra gente conseguir dar um passo à frente. Crescer é isso: agregar conhecimento, ser humilde para reconhecer as próprias limitações, buscar ir sempre um pouco além e não se deixar abater quando as coisas não são como planejamos. Por pior que seja a situação, sempre há uma saída.
Você acha que eu não tive mais impasses na vida acadêmica??? É claro que tive… fiz 4 (quatro) anos de cursinhos para conseguir passar em medicina. A cada frustração, a vontade de desistir era gigante, mas uma voz interior me dizia o contrário, para persistir. Com minhas notas eu conseguiria passar em qualquer outro curso e em qualquer universidade do país, mas minha determinação para fazer medicina sempre falava mais alto. No final do quarto ano de cursinho, fui passar 40 dias nos Estados Unidos com minha mãe sem pegar num livro sequer. Passei em três das cinco faculdades de medicina que tentei.
Depois que concluí o curso de medicina, vocês acham que eu passei direto pra residência??? Não, novamente… Muitos anos de estudo, muitos cursinhos, muito dinheiro investido… Mas com altos e baixos hoje eu estou aqui, plenamente satisfeita com minha profissão, orgulhosa do caminho que percorri, podendo compartilhar essa parte da minha história com vocês. Que ela sirva de amparo e seja fonte de energia pra você que pensa em desistir de algum sonho. Desiste não! Tem muita montanha pra ser cruzada, mas o rio é caudaloso e chegará onde tiver que chegar 🙂
“O insucesso é apenas uma oportunidade para começar de novo com mais inteligência.”
– Henry Ford